O embate entre STF e CNJ acobertando nossa omissão

Decisão tomada, o STF – Supremo tribunal Federal dá por encerrada a novela do CNJ, que a população acompanhou par mais de um mês na televisão, internet e jornais. O Conselho Nacional de Justiça “continua” com poderes para investigar magistrados sem previa anuência de foros regionais.

Entre os pontos positivos da questão, talvez esteja o fato de que durante esse tempo, uma parcela maior da população tenha tentado se familiarizar mais com a estrutura dos poderes nacionais, mesmo que por uma superficial curiosidade. Superficial porque a maioria, com certeza, ao invés de se aprofundar, preferiu se abster de acompanhar a discussão. Entre os motivos, constam dois principais: a) a desilusão relativa a tudo que diga respeito aos entes públicos; e b) boa parte da população sequer entendeu a desenrolar dos fatos, ou o que significavam.

Com tantas siglas (STF, STJ, CNJ, etc.) ficava a dúvida: – Afinal, o CNJ é um órgão paralelo, superior ou inferior ao STF? Imagine a indignação dessa população, se informada estivesse de que o CNJ é formado por integrantes indicados de cada um dos outros órgãos, entre eles o próprio STF. A propósito, o presidente do STF é também o presidente do CNJ. O que estavam discutindo então? Se eles mesmos poderiam ter o direito de se investigar?

Isso, sem levar em conta a indignação deste cidadão pelo fato de um órgão da justiça, que devia ser baluarte da transparência, ter medo de investigação. Afinal, não estava se discutindo se o CNJ poderia condenar, mas sim, se dependia de um processo prévio para poder investigar.

Se a maior parte da população tivesse esse conhecimento, estaria estupefata com a capacidade que houve de dar importância extrema para alguns fatos, para desviar a atenção de outros que mereceriam muito mais nosso efetivo envolvimento. Que eficiência o judiciário mostrou neste processo!

Desviou a atenção, por exemplo, da notícia divulgada com ênfase no Jornal Nacional, nestes mesmas semanas, dos rendimentos milionários de desembargadores do Rio de Janeiro, apesar de termos leis claras mencionando tetos salariais. Alguns deles, recebendo a “bagatela” de meio milhão de reais mensais.

Fiquei imaginando a isenção desses beneficiados julgando questões de supersalários de outros poderes; ou então, se também atuam com efetividade quando julgam pleitos de aposentados da iniciativa privada, reclamando das perdas salariais que têm tido ano após ano, em suas aposentadorias minguadas.

Naquela mesma semana, acompanhamos notícias sobre vazamentos de óleo na cidade de Tramandaí, onde a justiça parecia agir com agilidade. Acompanhamos também delegados agindo rapidamente em assuntos que, na sua ótica, eram de grande interesse nacional, como por exemplo, o suposto estupro do BBB.

Porém, confesso que não acompanhei ação concreta e de vulto, relacionada à investigação da notícia dos supersalários dos desembargadores.

Onde estavam os defensores ardorosos da moralidade das instituições públicas? Onde estava, por exemplo, o Ministério Público, que legalmente, tem a responsabilidade de “promover o inquérito civil e a ação pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”.

Somos muito medrosos. Erguer-se com bravura sobre entidades menores, sobre o simples cidadão, ou sobre organizações pequenas é fácil; mas mostrar coragem desafiando os próprios pares e, entre eles, aqueles que têm mais poder, é para poucos (neste caso, muito poucos).

Falar de ética e bradar por atitudes de respeito e moralidade é tão fácil, mas o discurso permanece vazio. Continuamos pecando muito mais por omissão do que por ações erradas. E alguns ainda perguntam por que nossas instituições crescem cada vez mais no quesito descrédito.

O valor da remuneração do desembargador demonstrado no Jornal Nacional supera o orçamento de alguns dos nossos municípios menores na região, considerando que dele depende o pagamento dos servidores e os investimentos de uma cidade inteira.

Não se contestaria o fato com tanta veemência se estivéssemos falando da iniciativa privada. O salário de 500 mil dólares mensais de Mark Zuckerberg, fundador do Facebook, não diz repeito a outros, mesmo que, pessoalmente considere um valor bem menor suficiente para uma ótima qualidade de vida.

Mas quando falamos da remuneração de pessoas desempenhando serviço público, oriundo do imposto pago por todos os cidadãos (inclusive o assalariado e outros “hipossuficientes” quando compram sua comida), espera-se sim, um volume maior de manifestações públicas às respeito desse caso.

Mesmo que possa ser legal (o que considero improvável pelo bom senso) é com certeza imoral e fere o princípio básico de alguém que ocupa tal posição: a notória idoneidade.

Continuo acreditando em nossas instituições. Temos excelentes profissionais desempenhando com afinco suas responsabilidades. Mas confesso, esperava sim, menos omissão.

Um comentário sobre “O embate entre STF e CNJ acobertando nossa omissão

  1. Parabéns pela maneira clara deste texto….Isso se chamara exercício da cidadania…Abraços,
    Ricardo Dreher – teu amigo

    1. Obrigado Ricardo.
      Tem coisas que ainda causam indignação sim. E o pior que são exemplos que colocam em xeque a credibilidade do trabalho de tantos outros profissionais que acreditam no que fazem e tem a ética como diretriz profissional.

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