Trânsito é um assunto corriqueiro na nossa vida, seja na mídia, ou nas habituais rodas de conversa. Exatamente por isso, também não é a primeira vez que escrevemos sobre o tema.
Numa dessas rodas de conversa, debatendo um acidente ocorrido em uma via próxima, e ouvindo os relatos sobre a postura dos pedestres, chamou a atenção como os argumentos eram escassos e evasivos; como se o pedestre não fosse participante do sistema de trânsito.
Lembrei imediatamente do meu pai que, desde a minha tenra idade, fez questão de ensinar conceitos para ser um bom pedestre. Talvez pelo fato de não termos veículo na época (com exceção de uma resistente bicicleta “Odomo Barra Circular”), e o ponto de ônibus ficar relativamente distante, havia uma preocupação enorme com a garantia da integridade dos filhos, ao caminhar na estrada. Percebo hoje a importância de tais conceitos: um bom motorista inicia sua educação como bom pedestre.
E ser um “bom pedestre” envolve saber que, assim como os veículos, sua interação com o trânsito é feita de direitos – e o pedestre tem e deve ter direito prioritário – mas também de deveres.
A concepção mais marcante que orientava as recomendações dos pais naquela época, era de que não havia triunfo em “ser um pedestre coberto de razão; quando se está morto”. Ou seja, no trânsito, mais importante que poder exercer determinado direito, é ter a certeza de que estamos seguros e protegendo nossa vida e integridade.
Pensei na importância de conversar sobre as mesmas coisas, hoje, com meus filhos e, mais do que isso, resolvi compartilhar aqui alguns desses tópicos norteadores da conversa, para outros pais que também acham útil conversar sobre trânsito com seus filhos.
Pesquisei um pouco sobre o tema, para não cometer gafes grosseiras com minha filha (hoje eles estão bem mais instruídos do que os pais em alguns assuntos), e mesmo sendo foco principal proteger a vida, independente da legislação, fiz questão de espiar um pouco da lei.
Pasmem: descubro que, dos 341 artigos do Código de Trânsito Brasileiro (L. 9.503, de 23/09/1997), apenas 4 deles (Art. 68 a 71) versam especificamente e de forma focada na relação do pedestre com o sistema de trânsito.
Contudo, agradaram algumas das disposições que mostram que lá longe, no passado, meu pai conhecia muito. Como por exemplo, quando expressava sua ojeriza e nos reprimia de maneira enfática quando caminhávamos lado a lado em vias sem calçada ou acostamento. No artigo 68 §3º, o Código faz referência à obrigação de caminhar em fila única. E é desta forma que organizo a seguir: tópicos diretos, como recomendações para qualquer pedestre que, além de consciente de seus direitos, seja consciente da necessidade proteger sua vida e a de sua família.

1) Fila única em vias sem calçada ou acostamento;
O local para o pedestre transitar é na calçada. Quando ela não existe, o pedestre se torna um “corpo estranho” na via, desenhada com foco no fluxo de veículos. Ao caminharmos lado a lado, podemos obstruir a visão de motoristas, tanto à frente quanto às nossas costas. O motorista, ao ser surpreendido, pode ter dificuldade de parar a tempo.
2) Atravesse na faixa de segurança;
Dispensa comentários. Todavia, faço questão de desdobrar este tópico a seguir, em itens muitas vezes menosprezados no bom convívio entre pedestres e veículos;
3) Avalie se a faixa oferece condições seguras;
Nos artigos do Código de Trânsito que tratam do pedestre, há referência específica à obrigatoriedade do poder público em construir passarelas e sinalizar eficaz e corretamente as faixas de segurança. Não é o foco aqui discutir os motivos, mas sabemos das deficiências nesse aspecto em alguns locais.
Portanto, em rodovias movimentadas, ao perceber que um carro se aproxima, aguarde-o passar. Se não for por paciência, que seja por consciência ambiental, já que cada freada e arrancado desnecessária aumenta a emissão de poluentes pela descarga do veículo.
4) Alerte os motoristas sempre (mesmo na faixa);
Entrar correndo, ou de sobressalto numa faixa de segurança pode causar acidente. Não surpreenda os veículos. Se o carro estiver perto, aguarde; se estiver longe, atravesse rápido, com a certeza de que ele lhe viu (levante ou estique o braço para sinalizar, se necessário).
5) Não coloque os motoristas à prova;
Se houver dúvida se um carro vai conseguir parar ou mesmo se tiver de frear com mais intensidade, aguarde para atravessar, mesmo com faixa de segurança. Um carro percorre em média 51 metros para parar definitivamente, se estiver a 50 km/h (velocidade permitida em muitos trevos de rodovias ou em vias urbanas). Com pista úmida, a distância é ainda maior; sem considerar uma desatenção do motorista que pode atrasar seu “tempo de resposta”à frenagem. (Em: <http://www.oficinabrasil.com.br/reparador-diesel/fras-le/677-distancia-de-frenagem>. Acesso em 08 de julho de 2014)
6) Atravesse na projeção do sentido das esquinas;
Onde não houver faixa de segurança, atravesse sempre na continuação das calçadas, normalmente, nas esquinas das ruas. Há uma tendência de os veículos já reduzirem sua velocidade nesses locais.
7) Seja objetivo ao atravessar;
Com ou sem faixa de segurança, atravesse sempre no sentido perpendicular à rua, em linha reta, que normalmente é a menor distância entre um ponto e outro da rua.
Importante: Seja rápido. Muitos pedestres dão total prova de falta de educação ao caminhar devagar ou até reduzir sua marcha buscando dar “mostra de poder” ao motorista que, educado, está aguardando sua passagem.
No mínimo, desconhecem a lei que fala que “iniciada a travessia (…) não deverão aumentar seu percurso, demorar-se ou parar sobre ela sem necessidade”.
8) Ande na calçada sempre que estiver disponível;
Use a calçada; preferencialmente, caminhando no lado direito. Isso significa dizer também: não ande sobre muretas ou sobre o meio-fio. Um rápido desequilíbrio, ou um veículo passando rente ou com retrovisor proeminente pode atingi-lo.
9) Peça ajuda;
Se for criança, idoso ou com algum problema de visão, concentração ou mobilidade, não tenha vergonha em pedir auxílio. Decida pela sua vida!
10) Faça certo, e seja educado;
Estamos tão acostumados a transgredir regras ou xingar, que esse comportamento, além de parecer natural, pode até parecer correto. Mas não se importe se o rotularem como “certinho”. Faça o correto e seja educado sempre, especialmente no trânsito. Xingar por qualquer coisa, pode significar encontrar uma pessoa desequilibrada e armada do outro lado. Não morra por futilidades.
11) Rua não é playground;
Por mais calma que a rua possa parecer, não é lugar para exercício de atividades esportivas, principalmente para crianças. Correr atrás de uma bola fora de curso pode ser uma corrida para um acidente.
O mesmo se aplica a outras atividades como skate, por exemplo. Por mais exímio que seja seu filho, lembre sempre que o skatista depende exclusivamente de sua perícia, já que o equipamento não tem volante ou freio – portanto, não é veículo legalmente autorizado a rodar nas estradas. Prefira parques ou praças.
12) À noite, veja e seja visto.
Todos os cuidados devem ser redobrados à noite. Ao notar aproximação de veículo, se não tiver a certeza de ter sido visto por ele, afaste-se ou saia do caminho.
Se tiver condições de usar roupas com detalhes reflexivos, é o ideal.
Estes são alguns lembretes básicos que lembrei aqui. São simples e objetivos. De forma nenhuma, é uma lista fechada ou definitiva – fique à vontade para compartilhar também a sua dica sobre o pedestre no trânsito. Alguns mais exaltados talvez discordem de alguns itens colocados aqui, mencionando que o direito do pedestre é supremo e os motoristas é que devem se adaptar. Mas isto vai de encontro ao que prego aqui: resguardar a vida, indiferente da questão de direitos.
Leve em conta que todos podemos errar, na maiorias das vezes, involuntariamente. Por isso, é preciso estar atento e preparado para o inesperado.
E lembre sempre do grande ensinamento que faria o trânsito fluir muito melhor: gentileza sempre!
REFERÊNCIAS:
OFICINA BRASIL. Distância de fenagem. Disponível em <http://www.oficinabrasil.com.br/reparador-diesel/fras-le/677-distancia-de-frenagem>. Acesso em 08 jul 2014.
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA; Casa Civil; Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997 – Código de Trânsito Brasileiro. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9503.htm>. Acesso em 08 jul 2014.
Republicou isso em A. M. Schneider.